Diário da Crise
Segundo dia
Os deputados do governo olhavam um pouco espantados aquela demonstração. Estavam de pé como nós, em respeito ao Hino Nacional. No entanto, pareciam duvidar que existíamos, que tínhamos voz e éramos capazes daquela demonstração, em pleno tempo de emergência. Um país novo está nascendo como uma criança sai da barriga da mãe e eles estão escondidos atrás dos tanques, com medo das bandeiras vermelhas, das bandeiras amarelas, das mulheres coloridas que invadem a esplanada.
Por isso é preciso muita tranqüilidade. Estamos diante de um adversário acuado, com medo e perdendo o contato com o real. Pelo que notei nos corredores do Congresso, ainda não há uma definição exata sobre a vitória na votação da emenda que restaura a democracia no Brasil. Não acredito cegamente no Congresso porque sei que existem muitos deputados capazes de suicidar-se politicamente.
A alegria e a força que sinto em todos nós não morrerá com nenhum desfecho parlamentar. A grande novidade é que o país inteiro tomou consciência da necessidade de dirigir o próprio destino e a grande cartada dessa transição nós jogamos e jogaremos nas ruas. Aí se decidirá nosso destino.
(...)
O desejo que se expressa nas ruas é o do fim da ditadura militar. Podem encontrar vários nomes, várias fórmulas, mas nenhuma conseguirá silenciar o grito de diretas já. Fala-se que diante de uma derrota o povo vai ficar deprimido e voltar as costas para a política. Discordo. O nível de consciência que se ganhou em torno da superação da ditadura é irreversível. E além do mais, nunca foi tão fácil derrubá-la. É só um empurrão de 100 milhões de pessoas retirando da estrada do nosso futuro esse baixo astral que ameaçou nossos melhores dias mas não conseguiu roubar o humor e a esperança.
Estou depositando em você minha esperança. Não me decepcione, baby.